terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Recebendo visitas - Minha experiência

Olá pessoal!! Dessa vez o texto é longo. 

Como escrevi dias atrás, eu estava ansiosa para receber pela primeira vez uma família indiana aqui em casa.  Quando as pessoas vão para a Índia e ficam na casa de alguma família sempre contam as experiências, mas e quando é a vez dos indianos virem à nossa casa, será que eles também sentem algo diferente? Quais as impressões que eles tem da gente?

A família que veio em casa não era do Punjab, a família era de Bihar. 
Fiquei com medo de fazer algo errado, cometer alguma gafe ou algo que comprometesse meu esposo diante deles. 

Eu fiz uma faxina na casa, troquei todas a roupas de cama, lavei janelas, banheiro,  área de serviço, fui ao mercado para reabastecer a geladeira com frutas e legumes porque eles eram vegetarianos.

Depois de  tudo em ordem fui para a cozinha. Cozinhei para 7 pessoas pela primeira vez , não sabia por onde começar, respirei fundo, e comecei cortando os legumes, depois tudo fluiu. Fiz palak paneer, subzi, chole e roti que em português _ espinafre com queijo cottage, refogado de legumes, grão-de-bico e pão indiano (pão sem fermento). Depois que fiquei sabendo que eles eram de bihar pensei que eu deveria ter feito arroz, não sei por que mas acho que eles gostam mais de arroz do que roti. 

 A cada 5 minutos eu olhava pela janela e cada carro que se aproximava o coração disparava, sério, eu estava muito ansiosa e insegura. Pensei, será que vão gostar da comida? Será que conseguirei me manter séria sem conversar muito? Não devo falar com nenhum homem? Será, será será?... De repente a campainha toca, abro a porta e os homens entraram dizendo um Namaskar (sem beijo no rosto e sem aperto de mão) e uma indiana linda que já abriu um sorriso, me beijou no rosto e me abraçou. Meus olhos brilharam quando vi um bebê lindo na minha frente, que alegria ter um bebê aqui em casa!! Meu marido rápido disse no meu ouvido "diga peri penaa para o mais velho.." que significa "toque os pés do mais velho" e assim eu fiz. A primeira coisa que disseram ao entrar foi " nossa, que bonito, que limpo!!"  é claro que fiquei feliz, afinal era essa sensação de limpeza e conforto que eu queria transmitir. 

Logo que eles entraram já fui pra cozinha pegar guaraná e algumas frutas secas e um mix de amendoins para servir a eles e me deparei com a seguinte cena: vários sapatos na entrada da casa e todos descalços. Adoraram os amendoins, frutas secas e guaraná, e claro, acabou a formalidade, o que pra mim foi ótimo.

A primeira coisa que a indiana disse foi: "nossa como você é magrinha!" e perguntou se eu trabalhava fora e se eu limpava a casa sozinha e também quis saber se meu marido me ajudava rs.
O tio deles brincou dizendo que precisava falar com minha mãe para conversar sobre o dote, mas eu já sabia que era brincadeira e caímos na risada. Como brasileira que sou não consegui ficar séria, recebi todos com um enorme sorriso, esqueci todas as formalidades, mas vesti uma roupa discreta como punjabi suit e causou uma boa impressão.

Não sei o que eles esperavam de uma brasileira mas percebi que eles se surpreenderam ao ver que uma mulher que trabalha fora sabe cuidar da casa também e sem empregada, porque na Índia é muito comum as pessoas terem alguém para ajudar na limpeza da casa. Um rapaz disse ao meu marido "você não me contou que aqui seria tão limpo, eu trouxe até um par de chinelos velhos porque não sabia que tipo de casa eu iria, mas aqui eu posso andar descalço!". Será que eles esperavam por uma casa sujinha e bagunçada? 

O mais velho da família me disse que me ensinaria algumas receitas indianas e é claro, adorei a ideia. 

De repente, eles me entregaram um embrulho com uma bata indiana e dois colares de presente.  

Estavam todos cansados e um calor muito forte aqui em São Paulo, tomaram um banho para eu servir a janta. Nessa hora que me surpreendi e vou falar porquê: eu não tenho mesa de jantar porque meu esposo e eu precisamos criar vergonha na cara pra comprar uma. Como somos só nós dois, usamos uma mesinha pequena e nem sentimos muita falta de uma mesa grande, mas nessa hora pensei "e agora?". Coloquei várias cadeiras perto da mesinha e fui pra cozinha. Meu esposo entrou na cozinha e disse "daqui a pouco ela virá te ajudar, fique tranquila" , ele falou com uma certeza de que a indiana viria para a cozinha me ajudar mas no fundo eu não queria que fosse assim porque eu queria que ela descansasse. Dito e feito, a indiana entrou na cozinha e já começou a colocar as comidas nas travessas, já levou tudo pra sala de um jeito super natural.

Quando cheguei na sala pra servir as visitas me deparei com uma cena que pra mim não é comum: ignoraram as cadeiras, cada um se serviu e sentou no chão, todos super despreocupados comendo com as mãos. O que eu achei interessante foi ver os homens levantarem e eles mesmos se servirem, não vi a esposa servir marido, ou esperar ele comer, aquela coisa toda que falam por aí. Enquanto eu ficava admirada com essas coisas, eles ficavam admirados ao me ver comendo com as mãos e o fato de eu ter feito comida indiana sozinha. O marido da indiana logo disse "veja, ela também come com as mãos, como a gente!!". Então eu disse que só a comida indiana eu uso somente as mãos, mas a comida brasileira uso garfo e faca. Perguntaram também como eu aprendi a fazer comida indiana, e meu marido respondeu: "Youtube!" 

A indiana que eu chamo de "bhabi" (significa cunhada) terminava de comer e já levava tudo pra cozinha. De repente escutei prato e panela batendo, uma barulheira danada, e quando vi era ela lavando a louça e tinha deixado a cozinha um brinco. Eu falei que não era para ela lavar louça, era pra ela descansar e ficar com o bebê, mas ela disse que lavaria rapidinho. E fez mesmo, coisa que eu levo 20 minutos pra fazer ela fez em 5. Vi que não adianta, a mulher indiana é ensinada desde pequena a ser assim e eu percebi que se ela não faz nada na cozinha é vista como folgada. Percebi também que o homem indiano espera e cobra isso da mulher porque quando a bhabi quis tirar meu prato da mesa e levar pra cozinha eu disse que não precisava, ela insistiu e o tio dela disse "deixe, a mulher precisa trabalhar na casa" (o que eu entendi foi: "a mulher não pode ser folgada e se dar ao luxo de não fazer nada"). Mas ela faz de uma maneira tão natural, sempre sorrindo,  e a gente aproveitou esse momento na cozinha pra conversar bastante coisa que não conversaríamos na frente de homem pois eles ainda mantém certos limites, homens e mulheres não se misturam muito. Ela ficou muito feliz quando a chamei de bhabi, quando eu a chamei assim ela disse "nossa, você conhece a palavra bhabi!" e desde então ela passou e me chamar assim também. Meu marido disse que nós somos Didi (sister) mas eu não sabia, então ficou Bhabi !

Ela disse que o Brasil é muito diferente e o que mais chamou a atenção dela foi o fato das mulheres namorarem bastante e só depois casarem, além de se casarem com mais idade do que na Índia. Eu perguntei se o casamento dela tinha sido arranjado, ela respondeu que sim, e que se casou aos 23 anos. Realmente existe uma diferença, porque eu me casei aos 27 e no Brasil é uma idade boa, mas na Índia eu estaria para titia. Ela disse que na Índia não tem namoro, você já se casa direto e isso a fez pensar muito na vida. Ela perguntou se minha vida mudou muito depois do casamento, eu disse que sim, 100% e eu perguntei "e a sua?" e ela respondeu "também". Eu acho que falta conversa entre as mulheres, elas sabem que terão que se casar mas não imaginam o que está por vir. No Brasil a gente se prepara, mas na Índia você pode estar solteira hoje e casada amanhã sem ter muito tempo para se preparar psicologicamente, por isso elas sentem uma mudança drástica da vida de solteira para a vida de casada. A mulher indiana não é ignorante, o que falta é encontrar alguém que converse normalmente com ela coisas que ela quer saber. 

Na sala, todos conversaram comigo normalmente, me respeitaram muito, mas eu percebi que a bhabi não ficava na sala conversando e assistindo TV todos juntos como faríamos com uma família brasileira. Ela ficava ou no quarto ou na cozinha e só ficava junto deles durante as refeições. Vi que ela quase não conversava com os homens da casa, só falava o essencial, não tinha assunto. Em compensação tiramos dia de mulherzinha, ela amou meu esmalte vermelho e quis passar igual e quis passar chapinha no cabelo também, que na minha opinião nem precisava pois ela era uma indiana jovem de 26 anos com os cabelos bem grossos, escuros e lisos. Lindo, lindo o cabelo! Mas ela ia para a Índia rever a família então queria ir bem bonita. 

Uma coisa que percebi é que a família indiana é muito unida para cuidar de criança. No início do post falei que veio uma bebezinha linda de olhos verdes, filha da bhabi. O que me chamou atenção foi o fato de ver cada um cuidando um pouco dela, incluindo tio, eles não ficavam só brincando com a criança, eles cuidavam mesmo. Até meu esposo cuidou um pouco dela. O pai está sempre presente. Pelo menos na minha experiência com as famílias brasileiras, eu vejo o bebê na maioria das vezes com a mãe, mas nessa família indiana eu vi o pai muito presente e carinhoso com a bebê, assim como os outros membros da família. Era só a bebê chorar que ele aparecia, ajudava a dar banho, etc. Vocês precisavam ver o sorriso dele quando eu disse que queria tirar foto da bebê, ele tinha muito orgulho dela.

No último dia, o tio dos indianos entrou na cozinha e disse: "hoje você não vai cozinhar nada, hoje eu vou cozinhar" e eu fiquei do lado para aprender a nova receita que ele me explicava enquanto fazia.
Após o almoço todos descansaram um pouco porque teriam que viajar de madrugada para a Índia. 

Na hora de ir para o aeroporto, bhabi trocou o vestido indiano do Brasil por uma calça e blusa de mangas compridas e quando tirou um pacotinho da bolsa eu vi a deusa Lakshmi se transformar diante dos meus olhos: toda aquela simplicidade reluziu em ouro. Apareceram os colares, brincos, pulseiras, anéis, piercing no nariz..tudo de ouro e pra finalizar um batom, só um batom! Pra que maquiagem com tanto brilho, não é verdade? Foi aí que percebi a segurança que ela sentia ao ir pra Índia, pois aqui no Brasil temos medo de usar um brinco e ela não usava nada, mas na hora de embarcar pra Índia foi toda montada porque ela sabe que lá dá pra usar.  

Eu fiquei super feliz, foram os melhores dias aqui em casa, são pessoas adoráveis, simples e trouxeram muita alegria. Bhabi é uma típica indiana, doce, meiga e o restante da família também.

Eu acho que eles não esperavam por muitas coisas assim como eu também. Esses poucos dias nos ajudaram a quebrar estereótipos que eles tem sobre a gente e que nós temos sobre eles. Acho que eles imaginaram uma mulher desinibida, que não sabe cozinhar nem limpar a casa e não conhece nada dos costumes indianos e eu imaginava uma família séria, com ar de superioridade, fria e difícil de agradar. Ambos os lados, brasileiros e indianos, aprendemos alguma coisa nesses poucos dias de convivência e uma delas foi "conheça antes de julgar".

Posso dizer que deu tudo certo, e se eu cometi alguma gafe, não me deixaram perceber!

Foi uma experiência incrível!!!

Abraços!!












16 comentários:

  1. Adorei a sua experiencia! que bom que deu tudo certo haha

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    1. Deu tudo certo!! Fiquei muito nervosa, acho que nas próximas vezes ficarei mais calma!!
      beijos

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  2. Oi Star,
    Fiquei aqui torcendo para dar tudo certo quando li o post anterior, não sabe como fico feliz por você ao saber que correu tudo bem!
    Eu mesma ficaria extremamente receosa de receber Indianos natos na minha casa, Deus que me livre eu cometendo gafes ou jogando o nome das firangi na lama... (Mais do que já é rsrsr)
    Acho bacana que você conseguiu passar tudo de bom que uma boa brasileira tem sem ferir os princípios tradicionais do seu esposo, aqui vai meu muuuuito obrigada por provar que nós também podemos ser boas esposas! <3
    Confesso que fico um pouquinho triste ao perceber que a Babhi não se encaixava muito ao lado dos homens como nós o fazemos, sei que é a cultura e provavelmente ela nem se dê conta, mas para nós parece um tanto solitário não é? Vamos torcer para que os gêneros possam se balancear por lá.

    Sobre a divisão no cuidado das crianças, isso é uma coisa que eu comento frequentemente com a minha mãe, como passei grande parte da infância e adolescência na Europa acho bem estranho nossa cultura brasileira do pai nunca estar realmente com os filhos (salvo alguns). Lá era comum ver pais com tanta responsabilidade, ou mesmo mais, quanto as mães e era muito bacana ver como isso funcionava. Fico feliz de saber que isso se aplicou a família que te visitou, assim vejo como o pai torna um pouco mais justa a vida da mãe. Brasileiros têm algo a apreender aí. rs

    Obrigada por compartilhar essa história tão legal de como uma brasileira e uma indiana quebraram estereótipos tão arraigados! Adoro seus textos, sempre me fazem refletir como é ser brasileira dentro de uma família indiana.

    Beijos & Abraços,
    Leticya.

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    1. Olá Letycia, muito obrigada!! Deu tudo certo! Você definiu muito bem, foi exatamente isso que me preocupou pois eu queria agir com naturalidade sem ferir os princípios deles, afinal sou brasileira.

      Também achei um pouco estranho essa separação de homens na sala e mulheres no quarto ou qualquer outro canto da casa mas é cultura deles né e eles mesmos nem ligam não. É até melhor do que ficar na sala ouvindo um papo chato de homem e ter que ficar servindo os homens toda hora hahaha pelo menos as mulheres ficam juntas e conversam bastante coisa. Uma vez vi uma entrevista de uma família árabe e a repórter perguntou porque a esposa saía da sala e não participava da conversa, o árabe respondeu: "_ Eu só tenho a sala, mas ela tem a casa toda". rs

      Sobre paternidade é verdade, já vi muitos pais europeus fazendo tudo, trocando fraldas, dando papinha, etc coisas que nunca vi no Brasil.

      Obrigada pelo comentário!! Foi uma experiência boa!

      Beijos!!

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  3. também estava esperando para saber no que isso ia dar...kkkkkk ainda bem que deu tudo certo! Se fosse comigo não conseguiria cozinhar nada além de panquecas e ovos! kkkk gostei muito desse post!

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    1. hahaha eu acho que só fervo leite! Mas graças ao youtube dá pra aprender algumas coisas, só preciso mais confiança na cozinha. Deus tudo certo!! Obrigada, Pryia!
      Beijos

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  4. Você fez uma perfeita colocação "conheça antes de julgar" isso serve para tudo e todos.

    Torço sempre por você querida amiga Star.

    Elis

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  5. Oi Star linda,
    Gostei muito do post, um dos mais interessantes do blog e admito fiquei curiosa pra estar aí e ver tudo de perto. A cada postagem aumenta minha curiosidade.
    Achei bem estranho o convidado falando que trouxe um chinelo velho hahahaha ele achava que a casa seria tão suja que precisaria de calçado, é isso?
    Beijos

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    1. hhahaha acho que é isso!! Também achei estranho!!!
      Obrigada, Mariana, tentarei escrever mais posts assim!!

      Beijos!!

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  6. Oi Star linda,
    Gostei muito do post, um dos mais interessantes do blog e admito fiquei curiosa pra estar aí e ver tudo de perto. A cada postagem aumenta minha curiosidade.
    Achei bem estranho o convidado falando que trouxe um chinelo velho hahahaha ele achava que a casa seria tão suja que precisaria de calçado, é isso?
    Beijos

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    1. hhahaha acho que é isso!! Também achei estranho!!!
      Obrigada, Mariana, tentarei escrever mais posts assim!!

      Beijos!!

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  7. Oi, Star!!!Obrigada por compartilhar conosco esta experiencia maravilhosa!! Tenho certeza que para eles, tambem foi uma experiencia magnifica. Que bela estoria!Um abraco forte.

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